A polêmica em torno do papel do Judiciário na efetivação das políticas públicas vai exigir do juiz novas funções. Não bastará decidir, o juiz terá de gerir o processo e fiscalizar o cumprimento de suas decisões, podendo se servir de técnicos para isso. “Falta aos juízes brasileiros um controle sobre a efetividade de sua decisão.” A constatação é da professora Ada Pellegrini Grinover, em palestra nesta segunda-feira (8/3), no escritório Antonelli & Associados Advogados, no centro do Rio de Janeiro.
A professora observou que o Poder Judiciário deve agir no sentido de implementar ou modificar uma política pública dentro dos limites da razoabilidade, da reserva do possível e oferecer o mínimo existencial, posição jurisprudencial firmada pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal. Em primeiro lugar, disse Ada, o Judiciário vai atuar no sentido de mandar incluir no orçamento previsão para determinada política pública com o controle necessário.
Caso o Legislativo não faça lei nesse sentido ou o Executivo não dê efetividade à política pública, há uma série de sanções previstas em lei, sobretudo ao Executivo, como a aplicação de multas. Ada Grinover não considera muito eficiente tal sanção, pois ela recai sobre a administração pública. Entretanto, lembra, a administração tem direito de regresso contra funcionário que descumprir a ordem judicial. Também há possibilidade de responsabilização por ato de improbidade administrativa e possível intervenção por descumprimento judicial.
“Vivemos em um momento em que se avolumam decisões, sobretudo por ações civis públicas para implementar políticas.” Para ela, não vai demorar muito até surgir uma situação atípica: serão várias ordens judiciais para incluir verbas públicas no orçamento em relação a um mesmo órgão da administração. Este se verá impedido de implementar tal política.
“No futuro, vamos ter de engendrar um sistema pelo qual o Poder Judiciário, através de seus Tribunais de Justiça, possa reunir esses processos sob uma espécie de conexão”, disse. Será algo semelhante aos instrumentos já introduzidos no Supremo e no Superior Tribunal de Justiça, em que se julgará um caso para aplicar a decisão em outros tantos, só que “às avessas”.
Ou seja, o órgão que ficasse impedido de fazer a política pela quantidade de decisões judiciais em determinado sentido, reuniria as apelações e as levaria ao TJ para que fossem julgadas conjuntamente dentro dos princípios de razoabilidade e da proporcionalidade. Assim, o Judiciário fixaria a melhor e mais adequada maneira de implementar a política pública.
Ada também afirmou que considera cedo estabelecer leis para dizer quais os limites da intervenção do Judiciário nas políticas e como operacionalizar soluções para esse tipo de problema. Criar leis nesse sentido, disse, pode engessar ideias que ainda estão amadurecendo. Ela entende que os critérios devem continuar a ser definidos pelo Judiciário. “Os tribunais estão no caminho certo.”
Mínimo necessário
Ada Grinover disse ainda que é indispensável que o Judiciário leve em consideração o que é, de fato, essencial ao implementar ou modificar políticas. A Ação Civil Pública, disse, pode ir além. Entretanto, a professora considera que para a intervenção do Judiciário em política pública ou para uma resposta imediata ao jurisdicionado sem que haja uma lei ou ato naquele sentido, é indispensável que se trate do mínimo existencial. “Não podemos banalizar a intervenção; temos de reservar a esse núcleo.”
Questionada pelo advogado Leonardo Antonelli quanto ao papel do Judiciário enquanto um caso é discutido pela agência reguladora, Ada afirmou que não é preciso deixar esgotar as possibilidades de solução pelo Executivo. “Às vezes, a via administrativa é tão penosa e tão demorada que o tempo urge e é preciso fixar.” Mas isso, disse, é em caso de inércia do órgão.
“As funções têm de ser exercidas pelo órgão constitucionalmente competente.” Ela disse que a maioria das ações civis públicas decorre da inércia da administração. Para ela, é preciso aguardar a decisão do órgão e dar um tempo para que ele exerça a função que lhe compete, dentro do critério da razoabilidade. Não pode ser cinco anos, diz, porque nesse caso será inércia. Ao Judiciário, fica a atribuição de controlar a constitucionalidade das políticas públicas e eventual intervenção desde que estabelecidos os limites.
Ada foi convidada, pelo escritório, para debater as ações coletivas no projeto "Conhecendo o Judiciário". Além de advogados do escritório, também participaram desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio.
Por Marina Ito
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