19/01/2010

Falido, cartão do SUS gera custo de R$ 401 mi

Inspeções feitas pelo governo federal flagraram cartões queimados e máquinas de leitura magnética abandonadas
Ministério da Saúde identificou problemas no programa criado em 1999 para agilizar atendimento do paciente na rede pública

DIMMI AMORA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

           Máquinas abandonadas como sucata em depósitos. Cartões jogados no lixo ou queimados. Equipamentos eletrônicos novos armazenados em caixas. Esse é o resultado de uma inspeção feita pelo Ministério da Saúde para avaliar o andamento do projeto do Cartão Nacional de Saúde, o Cartão SUS.
          Dez anos, seis ministros e R$ 401,2 milhões depois, o projeto não funciona e é fonte de desperdício e suspeita de desvio de dinheiro público.
          As inspeções ocorreram em 7 das 44 cidades onde foi implantado o projeto piloto do cartão. A ideia era que o cartão, com tarja magnética, contivesse o histórico médico do paciente, agilizando o atendimento.
         Em 2000 foi feita uma licitação para a compra de terminais de atendimento chamados TAS, para ler os cartões. Ao preço de R$ 89,2 milhões, duas empresas -Hypercom e Procomp- venceram a licitação para desenvolver as máquinas e os sistemas para utilizá-las. Na época houve denúncias de direcionamento da concorrência.
          Em três anos, 10 mil máquinas deveriam estar em todas as unidades de saúde dos municípios do projeto piloto.
          O Ministério da Saúde e 11 Estados deveriam receber outros equipamentos. Em 2001, a pasta autorizou gastos de mais R$ 33,9 milhões.
          Nas inspeções feitas em 2008 em Vitória, Florianópolis, Cabo de Santo Agostinho (PE), Campo Grande (MS), Betim (MG), Volta Redonda (RJ) e Castanhal (PA), foi constatado que dos 1.937 TAS entregues nessas cidades, só sete funcionavam em duas cidades: Castanhal e Campo Grande. O restante estava armazenado em caixas ou pior: 251 aparelhos sumiram.
          De 1,1 milhão de cartões magnéticos enviados a essas sete cidades para serem distribuídos à população, pelo menos 346 mil estavam guardados.
         "Nunca pedem o cartão para nada. É como se ele fosse só para andar na carteira", contou Vanabacia Gomes da Silva, 39, que procurava atendimento para a irmã em um posto de saúde em Cabo de Santo Agostinho. Elas receberam o cartão há quatro anos. Para ela, o atendimento da cidade não melhorou em nada desde então.
         No final de 2005, a Procomp foi contratada para um novo serviço dentro do mesmo projeto. Desta vez, sem licitação, ela ganhou mais R$ 11,8 milhões para desenvolver softwares em Aracaju e Fortaleza.
         A empresa recebeu todo o pagamento antes de fazer o serviço, de acordo com uma tomada de contas feita pela Controladoria Geral da União, que recomendou a abertura de inquérito para devolução do dinheiro.
        O Cartão SUS custou R$ 156,3 milhões entre 2004 a 2009 (valores não corrigidos monetariamente encontrados no Portal da Transparência, do governo federal).
         Entre 2000 e 2003, segundo a ONG Contas Abertas, já haviam sido gastos outros R$ 170,6 milhões. Há ainda R$ 74,3 milhões doados pela Unesco, órgão das Nações Unidas.
          Desde 2004, o maior beneficiário dos contratos do programa é a empresa de informática B2BR, do Distrito Federal, com R$ 33,3 milhões acumulados.
          Numa investigação realizada pelo TCU (Tribunal de Contas da União) sobre um dos contratos da B2BR no projeto, técnicos apontaram que houve superfaturamento de 126% na compra de software.
         A proprietária da B2BR, Cristina Boner, aparece em vídeos em análise na operação Caixa de Pandora, que investiga pagamento de propina a funcionários do governo do DF.


Fonte: Jornal Folha de São Paulo, 18/01/2010.

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